Em Janeiro deste ano, morreu em condições estranhas, na cela que ocupava, um recluso do Estabelecimento Prisional do Linhó. Solidários e revoltados com a falta de explicações para a morte do companheiro, muitos reclusos decidiram não ir comer ao refeitório e fazer greve.
A direcção da cadeia, nomeada pelo grupo do putativo engenheiro sócrates, decidiu reprimir o que considerou ser uma tentativa de insubordinação. Isto apesar de não ter ocorrido qualquer acto de violência. Em consequência, vários reclusos foram sumariamente enviados para outras cadeias, nomeadamente para o campo de concentração do Monsanto.
Outros, apenas por terem sido vistos a dialogar em grupo, foram punidos com 8 dias de castigo em cela disciplinar. Assim se escreve o socialismo democrático sócratino!
José Pedro Namora
Um grevista de fome preso no Estabelecimento Prisional de Monsanto está acusado disciplinarmente de ter divulgado mentiras sobre as motivações da sua greve de fome para subverter a ordem prisional e foi intimado a entregar aos acusadores e juízes em causa própria a informação por si directamente divulgada a respeito do caso, como forma de demonstrar o infundado da acusação.

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http://iscte.pt/~apad/ACED/Foto: SOS PRISÕES
“Autoridade” arbitrária e perseguição
Bruno Miguel Monteiro Brito está preso no Estabelecimento Prisional de Monsanto. Queixa-se de já começarem a ser evidentes as razões das suas queixas – que deu origem a ofício da ACED dirigido às autoridades. O Ministério Público de Cascais arquivou a queixa contra si organizada pelas autoridades da prisão do Linhó, porque o recluso a quem terão feito assinar vários papéis sobre o facto de ter sido vítima da violência de Bruno Brito, afinal não confirmou o que estava escrito por outros (não sabe escrever) e assinado por si (não sabe ler).
Esse processo, ao que tudo indica, terá apenas servido de pretexto para classificar de perigoso o queixoso e enviá-lo para Monsanto e para o regime de alta segurança, estando na cela 23 horas por dia, na sequência de uma saída precária (?!). Trata-se de um jovem, preso desde muito novo e cujo processo de ressocialização está gravemente afectado, evidentemente. Pelo que se percebe, afectado por pequenas intrigas e abuso (de falta) de critério, segundo a lógica de complicar o que é simples para “mostrar quem manda”.
Tudo começou – é esta a versão da família – pelo episódio de uma saída precária cujo regresso foi acidentado e acabou em cela disciplinar 10 dias, sem roupa da cama, ao frio da época, e sem comida durante dois dias. Mal acabou o cumprimento da sanção disciplinar, pensa-se que como represália pelas queixas então feitas pelo recluso contra o que considerou ser uma arbitrariedade e as perguntas das autoridades de tutela sobre o caso, logo surgiu a acusação de ter batido num companheiro. O tal que assinou documentos cujo valor substantivo foi apreciado pelo MP de Cascais, como acima é referido. Todavia, muito antes dessa apreciação poder ser feita, novo castigo de 28 dias foi imposto ao recluso por causa do que veio a não confirmar-se ter alguma vez ocorrido. Como resposta a um recurso contra o castigo, antes mesmo de passar o tempo do castigo, o preso foi castigado definitivamente e sem apelo pela transferência para a cadeia de Monsanto.
Pode dizer-se que a “alta segurança” é um modo de a “autoridade” arbitrária dos perseguidores de Bruno Brito ficar intocada? Sendo até, no caso, aparentemente mais um abuso de poder quotidiano da chefia de guardas que na altura reinava no Linhó e que acabou por ser afastada? Ao sistema prisional não deveriam poder ser assacadas as responsabilidades das dificuldades evitáveis mas sérias de ressocialização impostas a este jovem, como a outros?
Conspirações e torturas
A família de Paulo Romão apoiou e apoia a vontade do preso de denunciar como são forjados os critérios de perigosidade nas cadeias portuguesas. É convicção do preso – como é a nossa, na ACED – que os critérios de atribuição da classificação de maior ou menor perigosidade aos detidos, por não estar objectivada e estar fora do controlo das tutelas, são construídos em função de interesses pessoais e muitas das vezes determinados por favores que se trocam entre redes de cumplicidades tecidas no uso das margens de liberdade propiciadas a alguns agentes sem escrúpulos pela impunidade que faz das prisões um mundo à parte. Usam os reclusos como moeda de troca em função de interesses inconfessáveis.
A inauguração da prisão de alta segurança, a Guantanamo portuguesa, como ficou conhecido, naturalmente, ao afirmar – como afirmou – a impunidade dos torturadores e a arbitrariedade dos critérios sob as ordens do governo, estimulou as redes secretas de associados na maldade contra quem entendam útil ou simplesmente satisfatório dos seus instintos de vingança.
O reconhecimento da ilegalidade e ilegitimidade do regime prisional instaurado em Monsanto foi, a pouco e pouco, feito. Mas o mal nunca foi corrigido. Pelo contrário: o efeito de choque junto dos guardas, dos funcionários prisionais e dos presos produziu os seus efeitos e jamais o Estado ou o governo reconheceram terem praticado actos ilícitos. Isto é, o Estado responsável pela implementação de um regime prisional ilegal e desumano aceitou a “afinação” do regime em função da legalidade sem nunca assumir as suas responsabilidades criminais – porque maltratar ou torturar é crime – beneficiando (se é que isso beneficia alguém) do choque e pavor, enquanto reforçava e alargava as redes de cumplicidades internas às prisões que trocam favores entre si.
O mérito da denúncia de Paulo Romão (na foto), à custa de perseguições e penalizações previsíveis contra si próprio, é a de dar contornos empíricos e comprováveis – mesmo do ponto de vista judicial - a conjecturas como as que acabámos de esboçar. Não se trata de ideologia ou teorias da conspiração: trata-se de cumplicidades comprováveis desde a prisão de Coimbra até Monsanto, com protecção das instituições de tutela e de seitas secretas que enxameiam os partidos, o sistema jurídico e Portugal inteiro. Tudo isso está explicado com clareza na página da Internet que a família apresenta: http://paulo98.no.comunidades.net/.
Haja justiça neste caso, embora – não somos hipócritas – todos saibamos de quão difícil é ela emergir das instituições judiciais quando alguém de “baixo” pretende ver julgado alguém de “cima”.