segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Greve geral na cadeia de Vale de Judeus

Desde as 9h00 da manhã, os presos de Vale de Judeus entraram em greve geral ao trabalho, à escola, à formação e a todas as actividades.


Dizem que as novas orientações de impedir a entrega de géneros por parte das famílias, como tinha vindo a acontecer anteriormente, não são aceitáveis, pois tornam ainda piores as condições de vida no presídio.


Sobretudo a comida e o tabaco que as famílias entregavam são indispensáveis para se manterem no quadro de funcionamento actual da prisão. E as famílias não estão dispostas a depositar dinheiros para que fornecimentos equivalentes sejam feitos pela cadeia.


Por um lado, porque não lhes parece razoável pedirem-lhes que financiem o funcionamento da cadeia; por outro, para não alimentar preços elevados praticados no interior; e também porque a cadeia não tem modo de assegurar a variedade de produtos que as famílias traziam, nem a qualidade da confecção alimentar.


Os grevistas pediram à ACED para divulgar a sua decisão e o estado da actual situação naquela cadeia.

Negligência reiterada nos cuidados de saúde na cadeia do Linhó

A negligência nos cuidados de saúde prestados aos presos no Linhó está a colocar em risco uma perna de Hugo Miguel Gomes Teixeira e a saúde de Carlos Lopes Barbosa, casos que repetem ocorrências anteriores. Será a tolerância à negligência uma estratégia (de contenção de custos? De emprego de pessoas sem qualificações?) dos serviço de saúde no Linhó?

Hugo Miguel Gomes Teixeira está preso na cadeia do Linhó. Em Março último, numa rixa com outro preso, ficou com uma perna partida e teve de ser operado. A operação foi realizada no Hospital Prisional e o médico foi explícito ao informar o doente da necessidade de repor o penso de forma regular sobre a ferida, para que esta cicatrizasse sem problemas. Porém a médica do EP do Linhó, Drª Manuela, foi de opinião diferente. Entendeu que ao ar a ferida ficaria bem. O recluso ainda a informou do aviso do médico cirurgião. E até disse lembrar-se de um tipo de fitas usado em tais circunstâncias. A médica disse que a cadeia não dispunha das fitas. O doente disse que pagaria as fitas do seu bolso. Mas a médica que o atendia informou que quem mandava ali era ela. Infelizmente mandou mal.


Depois de meses à exposição do ar, o osso da perna ficou infectado e a solução parece ser a de raspagem do osso, isto é nova operação para recuperar os efeitos do não tratamento. Terá sido essa a informação prestada recentemente pelo cirurgião, na segunda-feira 19 de Setembro, que também informou haver disponibilidade de realização o acto médico para Janeiro ou Fevereiro.


Claro que isso se tornou uma fonte intensa de preocupação do recluso, ainda por cima por ter estado 19 dias a antibiótico – para conter a infecção – entre 10 e 29 de Agosto, e já não ser possível utilizar mais anti-bióticos para combater o avanço da doença. Imediatamente o espectro da amputação da perna veio à mente, caso que lhe fez lembrar o que aconteceu com um seu companheiro de prisão um ano atrás, em que uma unha encravada infectada negligenciada, também sob a tutela da mesma médica, acabou por resultar na amputação da perna até abaixo de joelho. Aliás, nessa mesma cadeia Hélder Costa partiu um pulso cuja funcionalidade ficou muito limitada por causa do tratamento negligente dos serviços de saúde e dos serviços prisionais, no caso com alegada cumplicidade de um médico de um hospital civil, segundo a ACED longamente deu conta em ofícios anteriores, com base nas denúncias da própria vítima.


Carlos Lopes Barbosa, também preso na mesma cadeia, é outro caso: queixa-se de as feridas profundas no peito, produzidas por arma branca (parece que a segurança no Linhó está incapaz de conter acidentes graves), estarem desprotegidas. Apesar dos seus pedidos de atendimento pelos serviços de saúde tal oportunidade não lhe é concedida pelos guardas. Para sua grande preocupação e risco.


A ACED pede atenção a estes casos graves mas também ao que possa estar por de trás deles, isto é da negligência dos serviços e da falta de interesse no controlo de custos de saúde. Certamente muitas outras vítimas deste estado de coisas devem ser possível encontrar entre os presos do Linhó.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

O último acto

Costelas partidas tratadas com comprimidos para a dor de cabeça (desfecho)

O recluso Luís Manuel Seixas Inocêncio, preso na Carregueira, terá sido observado por um médico ao fim da tarde de ontem. O diagnóstico terá sido de um descolamento da pleura com traumatismo e com forte inflamação derivado do tempo sem tratamento (desde sexta-feira de manhã até terça feira à tarde). Prognóstico: mês de cama para debelar a inflamação...

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Uma vilania em 5 actos…

Costelas partidas tratadas com comprimidos para a dor de cabeça na Carregueira


Os textos que agora publicamos são transcrições de ofícios remetidos pela ACED às autoridades. Pelo seu conteúdo poderá aferir-se da verdadeira natureza dos responsáveis penitenciários em Portugal, e compreender a razão do insucesso da reinserção social, bem como os elevados índices de reincidência

17 de Setembro

O recluso Luís Manuel Seixas Inocêncio, preso na Carregueira, faz dois dias, caiu na cela e partiu (assim julga) as costelas. Não consegue dormir e tem dores. Sente altos na pele que lhe parecem ser provocados por ossos partidos. Está sem acesso a assistência médica e a meios de diagnóstico adequados, apesar de os ter pedido. Os serviços deram-lhe paracetamol, que é o medicamento usado para as dores de cabeça.

19 de Setembro

O recluso Luís Manuel Seixas Inocêncio, preso na Carregueira, faz quatro dias, continua com dores e sem conseguir dormir. Urina sangue e não consegue deslocar-se sem ser com ajuda de companheiros a apoiarem-no. Continua sem nenhuma atenção de saúde.

19 de Setembro (2)

O recluso Luís Manuel Seixas Inocêncio, preso na Carregueira, foi ao Hospital Prisional para uma consulta de oftalmologia pedida semanas antes. Durante a visita ao hospital pediu ao guarda que o acompanhou para ser atendido por causa das dores no peito e da urina vermelha. Mas foi informado não ser possível. Voltou à cadeia e foi chamado por um graduado que lhe perguntou se tem usado o ginásio. Espantado o recluso perguntou-lhe se não sabia que estava na cela deitado com dores. Ao que o guarda respondeu que era para dar uma resposta à Provedoria de Justiça que tinha mandado perguntar isso mesmo.

Ao chegar à cela percebeu que a cela tinha sido aberta e revistada na sua ausência. Reclamou junto do chefe de ala, que não se mostrou surpreendido nem empenhado em tratar dessa irregularidade.

Compreendendo que se tratam de manobras de diversão para procurar respostas para a denúncia, o preso sentiu necessidade de informar a ACED que o crime pelo qual está condenado envolve vítimas guardas prisionais e que, por isso, sabe que não terá vida facilitada. Mas ainda assim não estava à espera de a vingança ser uma orientação geral que faz cumplicidades em tanta gente, como aquela que parece envolvida ou indiferente na manutenção do seu estado de sofrimento.

Continua, portanto, à espera de alguma atenção médica ao seu estado de saúde traumático.

20 de Setembro

O recluso Luís Manuel Seixas Inocêncio, preso na Carregueira, desde sexta-feira de manhã que pediu serviços de saúde para tratar de aquilo que julga ser costelas partidas. A caminho do quinto dia, após ter enviado para o exterior dos serviços prisionais, nomeadamente entidades inspectivas dos serviços prisionais (que entretanto abriram processos sobre o caso), as suas queixas de dores continuam sem acesso a cuidados de saúde. Apesar de ter estado ontem, segunda-feira, no Hospital e hoje ter assistido durante toda a manhã a chamada de companheiros seus à enfermaria (onde imagina possa estar um médico de serviço). Na aflição da situação, como explicar o que se está a (não) passar?

Trata-se, segundo o próprio, de algo que poderia esperar. Esta é a sua segunda passagem pela cadeia. Da primeira vez entrou em luta com outros presos. Para o castigarem, alguns guardas terão organizado um espancamento. Luís Inocência reagiu e feriu um dos atacantes, fazendo-lhe uma marca permanente. Depois de ter saído da cadeia ocorreu o julgamento do caso, para o que foi destacada uma advogada oficiosa – que, de acordo com o condenado, não se empenhou no assunto, faltando inclusivamente a vários actos processuais. No concreto, os queixosos presos acabaram por sair do processo, mas no fim acabou condenado a dois anos de cadeia por ter reagido ao espancamento dos guardas.

Ao entregar-se na cadeia sabia ao que ia. Mas não imaginou poder chegar a este ponto, disse. Ao ponto de incumprimento de responsabilidades básicas dos serviços – de cuidar da saúde dos presos –, de inconsequência prática da acção das instâncias inspectivas e de evidência descarada de uma política de fechar olhos conivente com práticas de vingança.

A sua indignação e as queixas que tem promovido, nomeadamente através da ACED, também são causa que reconhece de represálias, a juntar às outras. Isso explica o silêncio de muitas das vítimas de situações impróprias – na esperança, eventualmente lograda, de que as intenções vingativas se foquem noutro recluso qualquer e lhe permitam viver sem provocações – e explica também a actual insistência do recluso em contactar a ACED para informar sobre a evolução dos acontecimentos. É que apesar de ter cumprido 8 meses de uma pena de 2 anos, e reconhecer alguma racionalidade no raciocínio de aguentar as provocações por mais uns meses, de modo a evitar problemas maiores, entende ser necessário assumir a denúncia dos casos irregulares de modo a evidenciar a perversidade moral do funcionamento do sistema.

Por parte da ACED, estaremos à disposição dos presos que assim o entendam para comunicar publicamente aquilo que pensem dever ser divulgado.

20 de Setembro (2)

O recluso Luís Manuel Seixas Inocêncio, preso na Carregueira, pediu para vos transmitir a seguinte mensagem: os efeitos dos serviços da Provedoria no sistema prisional estão a perder a eficiência que já tiveram anteriormente. O recluso diz que essa convicção é partilhada por outros reclusos que conhece. Dá como exemplo uma entrevista que uma provedora terá feito com ele no reduto Norte de Caxias – e de que terá tido oportunidade de a ela se referir a altos funcionários da Provedoria. A senhora terá recebido as indicações do recluso sobre quais seriam as celas sem condições de habitabilidade e também a informação de que os guardas iriam resistir à sua visita daqueles espaços. Todavia, na prática, a senhora provedora não terá visitado outras celas que não a camarata modelo que os guardas lhe indicaram.

Infelizmente a ACED não pode dizer que coisas parecidas nunca aconteceram em situações do seu conhecimento. Pelo que se aproveita a oportunidade para apelar ao esforço de mobilização numa época que, sobretudo nas áreas sociais, o requer fortemente.

domingo, 18 de setembro de 2011

Abusos e maus tratos na Carregueira

Reproduzimos, na íntegra, uma carta remetida pela ACED à ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz

Ex.ma Senhora Ministra da Justiça


O recluso Luís Manuel Seixas Inocêncio, preso na Carregueira, teve oportunidade de reagir ao relatório que V.Exa. enviou à ACED em resposta às nossas queixas.
Previamente queremos salientar que as nossas queixas são produzidas com base em contactos muito breves com os reclusos e que, portanto, é natural que existam mal entendidos na transmissão das mensagens. Não apenas porque a interpretação que se faz das mensagens pode ser mal feita mas também porque as forças de expressão podem ser tomadas como factos.


Não estamos, pois, em condições de exigir de terceiros informações rigorosamente fiáveis e independentes dos interesses em jogo, nem o faremos. Mas podemos notar as contradições das explicações e procurar avançar na definição do que seja a verdade, em diálogo, apesar de não estarmos autorizados a comunicar com os presos (a não ser por iniciativa deles). Por isso ficamos dependentes de na ocasião em que somos contactados pelo mesmo preso (certamente a respeito de outro assunto, como foi o caso) termos presente o seu dossier e de haver tempo para dar a conhecer a versão dos factos contada pelos serviços prisionais, de modo a ser possível contrapor o que houver a contrapor. É nesse espírito que nos dirigimos a V.Exa.


O recluso já está em cela individual e o caso que aqui vamos referir está, para ele, encerrado. Mas não foi por reclamar cela individual que ele entrou em greve de fome, ao contrário do que se diz no relatório. Terá sido, insiste o recluso, por ter estado demasiado tempo na admissão, portanto em regime especial. A norma prática são estadias de 2 ou 3 dias, disse. E pede atenção ao facto de não ser de ânimo leve ou por prazer que se entra em greve de fome. Só se entra numa luta desse tipo precisamente por se ter sido apoucado e desprezado. No fim, a greve de fome é uma forma de reclamar respeito.


Agora terá a ACED de fazer um esforço de memória, apoiado em notas, para procurar dar elementos que possam, por um lado, revelar as práticas prisionais e, por outro lado, corrigir, de acordo com a versão do recluso, o que efectivamente se terá passado.


No relatório apresentado nota-se haver um problema de incoerência com as duas datas de entrada no Hospital. Depois de sair dia 20 não poder ter entrado dia 11.O recluso não sabe indicar datas. Mas sabe que entrou em greve de fome ao nono dia de estadia na cela de admissão. Não por querer cela individual mas por saber que normalmente os presos estão 2 ou 3 dias naquela regime e por serem dez dias o número máximo de dias autorizado por lei. No vosso relatório diz-se serem quinze os dias legalmente admissíveis. A convicção do recluso é a de que são 10 dias. E sobretudo que, na prática, são muito menos dias a norma. O facto de legalmente ser admissíveis estadias de 15 dias na admissão não significa que não exista obrigação de informação ao recluso sobre as regras legais e também as regras tácitas vigentes. Do mesmo modo, a informação dos serviços para a informação do público poderia aludir a essas facetas. Teria a vantagem de assegurar os leitores de que a lei não é entendida como um escudo contra as eventuais responsabilidades disciplinares de quem não respeita a lei mas antes como um quadro de referências normativas para se cumprirem as finalidades institucionais.


A greve de fome atirou o recluso para um regime especial de isolamento considerado próprio para essas situações, sem autorização para contactar com o exterior. Foi por isso que, disse, suspendeu a greve por um dia, de modo a obter a possibilidade de comunicar com o exterior, e logo voltou à greve de fome, para reclamar respeito, no sentido acima mencionado.


As contas que o recluso faz são que esteve 20 dias em regime extraordinário – admissão, isolamento por razões de greve de fome, no hospital prisional (depois de ter passado por um hospital civil). Não são de facto os meses referidos na queixa da ACED, embora possam parecer meses para quem está preso e se sente desrespeitado. Mas também não são 4 dias na admissão: são nove dias e depois (no regresso do Hospital) mais 3 dias, segundo o relato do recluso. E foi precisamente por o estarem a preparar para ser vergado, isto é para aceitar estar em admissão o tempo que as autoridades prisionais entendessem, que entrou em greve de fome ao terceiro dia da segunda entrada na admissão.Com certeza que os registos de entrada na cadeia e no hospital prisional poderão desfazer aqui as dúvidas que possa haver. Pois no relatório prisional diz-se que o recluso entrou no hospital 9 dias após dar entrada na prisão (vindo do hospital) e o recluso diz ter entrado em greve de fome nesse dia, tendo sido – se bem entendemos – transferido dentro do EP para a zona de presos em greve de fome. Estes relatos são contraditórios com os mesmos registos de entrada e saída.


Quanto ao caso do rasgar do papel com o número de telefone da mãe adoptiva há uma história a contar e um comentário a fazer. Comecemos por este último. O que terão os serviços prisionais a ver com a relação adoptiva da senhora que o preso chama mãe adoptiva e o recluso? A que propósito vem o comentário sobre a estranheza da senhora directora a respeito de o recluso ter duas mães? Porque não indagou junto da educadora o que possa tal relação querer dizer? Porque se permite redigir insinuações vazias de conteúdo num documento oficial em resposta ao gabinete da senhora ministra? Não nos parece razoável o pensamento de intromissão na vida privada dos reclusos e ainda menos a prática de partilha dos desejos de intromissão com os superiores hierárquicos.


O que estava em causa era a possibilidade de inscrição no registo dos telefones autorizados ao recluso o número de telefone da senhora, que trata como mãe (apesar de também tratar como mãe a sua mãe biológica). Ao contrário do que está escrito, ao recluso não foi inicialmente autorizada a inscrição do telefone da mãe adoptiva por este número não estar identificado nominalmente, como é obrigatório para os serviços prisionais. Foi no processo de registo do número, depois de chegados à prisão os documentos requeridos, que o episódio do rasgão do papel ocorreu – por manifesta falta de respeito.


O episódio foi exposto à directora e à educadora. Ao contrário do que está escrito. Ainda recentemente o assunto terá vindo à baila numa conversa com a educadora, disse o recluso.


Em resumo: o recluso não reconhece o texto do relatório subscrito pela senhora directora como um documento capaz de fazer justiça ao que se passou. Mas reconhece que a situação de discriminação e falta de respeito que sentiu ser-lhe dirigida durante um tempo, e que o levou a reagir com greves de fome sucessivas, já não ocorre. E que o facto de estar com costelas partidas sem tratamento – como parece ser o caso actualmente – não é uma atitude discriminatória contra si. (O que deixa a ACED mais inclinada do que já estava a pensar ser a negligência no cuidados de saúde uma das políticas de austeridade em prática nos serviços prisionais.)


A ACED deseja contribuir para que as políticas prisionais possam ser escrutinadas e que os políticos sejam chamados a fazer as políticas prisionais, em vez de as deixarem nas mãos a que até agora têm estado entregues. Em particular lamentamos que os serviços de inspecção se revelem incapazes de identificar com independência e objectividade os problemas de “falta de respeito” (as políticas de quebrar a dignidade dos presos para mostrar que quem manda), fechando assim um círculo corporativo de poderes nem sempre ao serviço do Estado.


Por isso vemos com interesse a comunicação que a senhora ministra entendeu enviar-nos a respeito deste caso.


A Direcção da Associação Contra a Exclusão pelo Desenvolvimento

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Verão quente nas prisões portuguesas

Só no dia 31 de Agosto, a Associação Contra a Exclusão pelo Desenvolvimento (ACED) remeteu seis denúncias para as autoridades, o que indicia que, neste Verão com chuva e frio, as prisões portuguesas arriscam calor acima da época…
Aqui as reproduzimos integralmente



Abusos e maus tratos contra presos em Monsanto


Admilson Pires, desorientado, pede ajuda.


Mas que ajuda é possível perante um Estado que entende necessário justificar regimes de alta segurança prisional de facto usados como sistema de intimidação?


Se assim não fosse, de Monsanto não viriam as mesmas mensagens como que tiradas a fotocópia: referindo a provocação e a violação de direitos (nomeadamente de correspondência) usadas para manter ocupados alguns lugares na cadeia. Na falta de justificação para a existência de um tal regime (que se prevê necessário um dia) vai-se usando e valorizando gente capaz de minimizar outros tão baixo quanto a eles próprios se minimizam.


A ACED cumpre a sua função: levar a voz dos que teoricamente (na lei) têm voz mas na prática o Estado recusa aquilo a que teoricamente é obrigado. Como faz isso? O valor da história que Admilson conta é que pode oferecer respostas a essa pergunta.


A sua esperança estava fixada numa data próxima em que a “avaliação” permitisse ao sistema reconhecer o seu bom comportamento e voltar a fechá-lo numa prisão com um regime regular. E mais uma vez compreendeu que não pode ter nenhuma garantia de segurança no comportamento das autoridades. São capazes de qualquer coisa para manter necessária a alta segurança.


Admilson entrou em Monsanto dia 18/jun/2010. E testemunha a existência de uma situação geral de injustiças quotidianas e abusos de poder. Responsabiliza, naturalmente, a direcção. Como é lógico. Em concreto concentra a sua mensagem em duas histórias que lhe terão parecido mais relevantes.


a) quando entrou aconteceu-lhe isto: condenado a 21 dias de cela disciplinar foi informado pelos serviços jurídicos de que dispunha de 5 dias para recorrer. Recorreu. E enviou a carta pelo correio. Mais tarde recebe a resposta do TEP informando que o recurso tinha chegado fora de prazo ao tribunal. A carta só pode ter sido retida pelos serviços – que medeiam obrigatoriamente entre o recluso e os correios. Não é a primeira queixa recebida na ACED sobre a existência desta estratégia de inibição de direitos de recurso.


b) quando se preparava para sair de Monsanto, a poucos dias da avaliação, aconteceu-lhe isto: assistia a um curso de inglês. Notou um olhar fixo do chefe Estrela. Mas não deu importância. Ao sair da sala de aula foi interpelado agressivamente pelo chefe em causa, queixando-se de palavras impróprias que o recluso lhe teria dirigido. Compreendendo a má intenção do guarda, o recluso limitou-se a não reagir. A participação contra si, porém, avançou e foram ouvidos em processo de inquérito os reclusos que estavam na sala (o professor não o foi, estranha Admilson). Todos confirmaram não ter ouvido nada mas, tudo resumido, 8 dias de cela disciplinar e uma mancha no cadastro nas vésperas da avaliação, apesar de ninguém ter ouvido nada.


No relatório de avaliação o episódio torna-se uma coisa de extrema gravidade que é “tratar mal um guarda”. “Se estou dentro da sala, como será que posso tratar mal um guarda que está do lado de fora de paredes de vidro grossas, sem que toda a sala e o próprio professor dessem conta dos gritos que seriam necessários para passar uma tal barreira?”O relatório de avaliação também mencionava os “casos graves” que o levaram a dar entrada em Monsanto sem os referir ou explicar em que medida e durante quanto tempo serão graves tais casos.


Admilson pede ajuda para organizar a sua própria cabeça. O que se está a passar com ele? Quer saber. A ACED tem uma opinião sobre isso e deixou-a expressa de forma muito sucinta no início deste ofício. Mas uma tal explicação não é compatível com a existência de um estado de direito.


Haverá melhor explicação para aquilo que se está a passar (sem ser aquela ideia de que os presos mentem sempre e os carcereiros dizem sempre a verdade)? Como é que a finalidade inscrita na lei para os serviços prisionais se compagina com práticas susceptíveis de desorientar as vítimas com base na falta de critério?
A haver respostas credíveis a estas perguntas, elas seriam certamente uma grande ajuda para Admilson Pires e para outros, entre os quais os próprios membros da ACED. Caso haja quem esteja em condições de proporcionar uma tal ajuda, que avance. Agradecemos antecipadamente.

Maus tratos e discriminação


Criado no EPL o ambiente de terror que se descreveu sucintamente é difícil – precisamente – ter acesso a identidades de queixosos. Em circunstâncias menos abusivas do que aquela que parece ser o caso no EPL, é muito raro os reclusos queixarem-se, como o Senhor Inspector não poderá negar. Evitam perseguições que necessariamente se sucedem contra quem a tal se atrever. A decisão de avançar na denúncia é, portanto, um risco cujo perigo dificilmente pode ser calculado – vários casos que a ACED tem relatado mostram isso mesmo.


Naturalmente que a ACED compreende que não serão os serviços de V.Exa. que irão endireitar aquilo que nasceu torto. Porém, neste caso concreto, tendo a ACED expedido em 26 de Janeiro deste ano uma denúncia de um acto de inspecção que ou ficou a meio ou foi (como há quem tema) uma forma de produzir uma lista de potenciais queixosos para os tramar, não tendo até hoje a ACED recebido nenhuma informação sobre o sentido das averiguações feitas a este caso, estranha o descarte das situações denunciadas nestes casos em apreço como meras vacuidades.


Ou melhor dito: a ACED sugere a V.Exa. que utilize os queixosos que deram o nome a senhor Inspector Inácio Francisco Simões de Oliveira (dezenas, segundo nos informaram) dispostos a falar – caso haja quem esteja disposto a ouvi-los sobre as barbaridades a que tem sido sujeitos no EPL. Que junte o presente processo ao processo aberto a propósito do oficio citado e ainda não fechado.


Infelizmente a ACED não tem nem meios nem autoridade para assegurar comunicações com os reclusos ou, menos ainda, assegurar que não serão vítimas de represálias por se queixarem. Mas existindo já uma lista de testemunhas na posse dos serviços prisionais, a nossa sugestão é que os vossos serviços procurem essa lista e a usem para os mesmos fins em vista: fazer um cenário geral sobre o estado de repressão abusiva que alegadamente se vive naquela prisão.

Incapacidade de cuidados de saúde no Linhó


Um recluso de nome Jorge começou a sentir fortes dores e foi atendido pelos enfermeiros de serviço pelas 14:00 de hoje. Apesar dessa atenção, as dores mantiveram-se sem alteração e, perante isso, os enfermeiros manifestaram a sua incapacidade de tratar do problema antes das 16:00, quando esperavam que pudesse aparecer um dos dois médicos ao serviço.


Esta urgência que aconteceu com o Jorge pode acontecer com qualquer um dos outros presos, impedidos de procurarem ajuda e, ao mesmo tempo, sujeitos ao que o caso vier. Que pode não ser nada – além do sofrimento – como podem ser consequências irreversíveis.


A ACED pede uma avaliação da situação com vista a vir a ser possível evitar situações como esta para o futuro.

Redução da ração para metade no Linhó


Hoje ao almoço a entremeada foi servida com metade da dimensão habitual. Costuma calhar duas peças a cada preso mas desta vez cada uma das peças foi cortada ao meio e assim completas as duas peças com metade do alimento. A ACED retoma a chamada de atenção já feita a respeito dos medicamentos e recorda o estado calamitoso a que o sistema prisional chegou em meados dos anos 90, onde a suborçamentação se juntava à sobrelotação, tendo Portugal atingido taxas de mortalidade nas prisões jamais atingidas na Europa.

Abusos contra as visitas na prisão de Caxias


Visitas recentes à prisão de Caxias têm sido sujeitas a desnudamentos e a apalpações brutais para que seja autorizada a visita. A humilhação é de modo a incomodar as vítimas ao ponto de não lhes ser possível evitar o choro.


Tais práticas tem sido denunciadas em outras prisões, sendo que as pessoas se sujeitam a isso para visitar os seus familiares e amigos e, por isso, preferem não apresentar queixa e aceitam manter a situação. Pela reacção das autoridades às queixas anteriores, nomeadamente às queixas formuladas pela ACED, dá a impressão (que pode ser incorrecta) de as ordens para proceder desta forma (dissuasão pela humilhação) vêm de cima. Pelo menos não há nenhuma urgência em tratar do assunto de modo a evitar que ele se banalize. A ACED chama a atenção que as humilhações por muito vulgares que sejam nunca são banais. E são sempre criminosas, mesmo quando não há queixosos dispostos a dar a cara, com receio de mais abusos.


A ACED insiste na necessidade de por um fim a tais práticas onde elas existam, mesmo que não seja possível identificar os abusadores e humilhadores profissionais.

Más práticas de educador na cadeia do Linhó


Jorge Manuel Teixeira Agostinho está preso no Linhó. Teve consultas de âmbito psicológico com o Dr. Rui Coelho onde falou sobre a sua vida íntima, a propósito da actividade criminosa que desenvolveu, com vista aos objectivos a atingir por essas consultas. Entretanto o Dr. Rui Coelho tornou-se educador prisional e foi colocado em posição de ser o educador responsável por seguir a vida prisional do recluso e de dar parecer sobre ela ao Conselho Técnico.


Acontece que no dia 19 de Maio de 2011 o recluso entregou o seu primeiro pedido de saída precária. Mais tarde, o educador em causa informou o recluso de que o seu pedido tinha sido indeferido, o que não foi surpresa para o recluso. Sabe do saber feito de experiência dos outros reclusos que o primeiro pedido não é "dado" mas o segundo, esse sim. Sabe também que só é possível fazer pedidos de saídas precárias alguns meses após a resposta ao último pedido feito. Como sabe que a época do ano mais adequada para gozar uma precária é a época de Natal/fim do ano.


Ora veio a saber mais recentemente que, afinal, o pedido de saída precária só deu entrada a 13 de Julho de 2011. E que a informação sobre o indeferimento não é verdadeira, pois ainda não há uma decisão sobre o assunto, cujo agendamento para o conselho técnico está feito para a próxima reunião.


Como é que isto é interpretado (e sofrido) pelo recluso? O educador, por alguma razão (por exemplo, pelo efeito de saber detalhes pouco abonatórios da vida do recluso) sentiu vontade de lhe prejudicar a vida. Então, a exemplo do que terá feito anteriormente noutros casos de que Jorge disse ter conhecimento, o Dr. Rui Coelho escolheu uma data de entrega dos pedidos de saída precária de tal modo que impede que o pedido com maior hipótese de ser efectivamente concedidos (os segundos, como se disse acima ser a rotina) possa ser respondido em tempo útil para calhar na época de Natal/fim do ano (na medida em que para que isso aconteça é preciso que tenham passado os meses que regulamentarmente devem passar antes que se possa meter novo pedido.


Em resumo e na prática: para que a saída calhe no Natal, Jorge terá que esperar para o ano de 2012 e rezar para que na altura própria o educador não volte a escolher o dia em que dá entrada ao pedido. Este ano a entrada do seu pedido em Julho impede-o de voltar a fazer um pedido em tempo útil (e já era previsível que assim fosse, como todos sabem na prisão). Do ponto de vista da ACED não deve ser possível que a mesma pessoa que trabalhou com um recluso como psicólogo volte a trabalhar com o mesmo recluso como educador. Essa incompatibilidade deve-se ao facto de o sigilo do psicólogo ser necessário e obrigatório, sem o qual o trabalho do psicólogo prisional se arrisca a deixar de ser viável daqui para a frente, assim se espelhem notícias como esta.


Outro problema é a possibilidade de manipulação dos processos de interesse e responsabilidade do recluso por parte do educador, cuja autoridade para o fazer é nula e cuja conduta nos termos descritos parece admissível, sob que pretexto for.


O recluso e a ACED esperam por uma clarificação destas duas situações, na esperança de vir a ser possível - no futuro - que casos como este não voltem a acontecer.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Surto de gripe sem tratamento na prisão de Vale de Judeus

Euclides Gonçalves Tavares e Ricardo Freitas Costa Fernandes são dois dos cerca de 60 presos engripados em Vale de Judeus, a quem não são dispensados medicamentos (o atendimento médico não é negado mas não foi suficiente para evitar o contágio). Por outro lado, por decisão da directora, os serviços não admitem medicamentos entregues pelas famílias ou amigos. Nas presentes circunstâncias, há quem tente envios por correio, na esperança que não sejam impedidos.

Lamentavelmente há sinais de estarmos perante uma política de contenção de despesas à custa da saúde dos presos. Alguns meses atrás, houve mesmo um representante dos hospitais que disse à comunicação social que iria deixar de fornecer medicamentos caros a reclusos como forma de satisfazer as exigências do governo. Infelizmente, por outro lado, as políticas prisionais a este respeito (como noutros) pecam por opaca e as informações dispensadas quando há alguma resposta não são fiáveis.


Por isso, tendo em conta que o regime de austeridade do tipo daquele que está a ser aplicado em Portugal tem tido, noutros países, consequências graves ao nível da saúde (fala-se em diminuição de 5 anos na esperança de vida), causadas pela contenção das chamadas despesas sociais, a ACED entende ser pertinente aproveitar este caso para pedir à Procuradoria-geral da República que investigue as políticas efectivamente postas em marcha nos serviços prisionais que possam interferir com a saúde dos presos – para além das consequências nefastas do encarceramento – na perspectiva de assegurar o respeito pelos direitos humanos dos prisioneiros, conforme consta das prioridades declaradas por esse organismo de Estado.


Pelo mesmo motivo, a ACED pede a atenção da Ordem dos Médicos no sentido de garantir que os médicos ao serviço dos serviços prisionais se comportem conforme manda o seu código deontológico, na esperança que tal comportamento possa ser uma forma de regulação capaz de evitar que as tendências economicistas actualmente dominantes se tornem causa de atentados aos direitos humanos dos pacientes em reclusão.