segunda-feira, 28 de junho de 2010

Linhó: 5 histórias de... arrepiar

Uma saúde doente

Vítor é o preso com o nº 7 da cadeia do Linhó. No trabalho caiu-lhe um ferro quente no pé e provocou uma infecção. Queixou-se disso e foi-lhe dado baixa, como é costume. Mas também como é costume pouca se alguma atenção lhe foi dada ao caso. Entretanto o problema na unha tornou-se um problema do dedo do pé. Sem que os serviços de saúde e em particular a médica de serviço, Drª Manuela Alvarez, tenham entendido pertinente qualquer tratamento. Faz dois meses, cerca de um ano após o incidente, o pé do Vítor do amputado.


Hélder Costa, por seu lado, ao carregar uma plataforma no seu local de trabalho lesionou o punho esquerdo. Mais tarde, ao cair em actividades desportivas, a lesão aumentou e tornou-se mais evidente. Faz cerca de dois anos. Queixou-se à médica e foi-lhe dada baixa. Tratamento é que não. A lesão nunca mais deixou de o preocupar. Ataduras, massagens e pomadas não reverteram a situação. Faz cerca de 8 meses, numa consulta no Hospital Prisional acerca do problema o médico informou-o de que tinha partido o pulso mas que nas actuais circunstâncias pouco ou nada seria possível fazer para melhorar a situação tanto funcional como das dores que sente (nova consulta no Hospital da Parede terá confirmado o diagnóstico). Trata-se de um jovem de 30 anos que precisará de trabalhar para ganhar a vida, uma vez integrado em sociedade, mas os simples trabalhos leves com que se ocupa na prisão tornam-se dolorosos devido à lesão não tratada.

O mesmo recluso sofre de uma pubalgia diagnosticada desde Março de 2009. Continua a não ser tratada, apesar de por vezes se queixar de dores. É certo que por vezes lhe são receitados medicamentos – geralmente sempre os mesmos, independentemente das circunstâncias (pelo menos assim pensam os doentes) – sem nenhuma explicação nem do diagnóstico, nem do efeito esperado dos medicamentos, que seja como for parecem não curar.

Agnelo Lobo – este é o caso actualmente mais urgente, sem desmérito dos outros, para que chamo a especial responsabilidade das autoridades que recebam este ofício – faz cerca de 15 dias que se queixou de um problema nos testículos. Foi-lhe dada imediatamente baixa. Porém nenhuma consulta sobre o assunto foi organizada e nenhum tratamento está receitado. Junta-se a isso a desconfiança generalizada na médica de serviço e o terror de não haver remédio quando o assunto vir a ser tratado.

Parece razoável, face a estas queixas, fazer uma reavaliação da situação dos cuidados de saúde naquele estabelecimento e assegurar o tratamento dos doentes.

Para que serve o livro de reclamações?

Hélder Costa, preso no Linhó, tem dois problemas de saúde: um pulso partido que não foi tratado e que provoca dores ao mesmo tempo que implica limitações funcionais na mão. Outro problema é uma pubalgia que tem reflexos em dores lombares. Os cuidados de saúde, se assim lhes podemos chamar, de que tem sido alvo não só não têm sido eficazes como não lhe inspiram confiança. Como outros presos naquela cadeia, sente ser o serviço médico negligente e desatento. Parece que as consultas interrompem as comunicações telefónicas da médica de serviço.
Por isso, Hélder Costa tem vindo a queixar-se, pelos meios que entende adequados. Mas também consigo, como em geral, a directora – e por aí abaixo todos os funcionários, como as educadoras – parecem estar ali para não serem incomodadas. Ninguém reage ou sequer responde às queixas.



Feito um requerimento para ter acesso ao processo de saúde também não houve resposta. Também a administração parece ter sido infectada pelo vírus da imobilidade. Pedido renovado, outra vez sem resposta. Mais uma insistência e lembrou-se que existe um livro de reclamações. Vá lá, o acesso ao livro de reclamações foi permitido. Mas a resposta é que parece ser a mesma de que as obtidas nas queixas anteriores: nada.

Haverá registo médico de Hélder Costa na prisão do Linhó? Haverão razões para que tal informação não seja disponibilizada ao preso? Quem poderá responder a tais perguntas? Quem poderá entregar a informação pedida ao preso?

Procedimentos de entrada e saída

Hélder Costa, preso no Linhó, saiu de precária. Deixou uns óculos de sol na portaria, entregues a quem os aceitou, em nome da prisão. Todavia nenhum registo ficou dessa operação. Parece ser esse o procedimento habitual. Dá-se o caso de à chegada, os óculos terem desaparecido. Informaram simplesmente isso mesmo ao recluso.


A pergunta é simples: isso é assim? Pode ser assim? Deve ser assim?

Outra situação – reclamada pelo mesmo recluso – refere-se ao cartão de cidadão. Em saída precária, o preso sai da cadeia e não é autorizado a levar consigo o cartão de cidadão? Sai da cadeia indocumentado? Caso pretenda tratar de assuntos oficiais, como fará? E é legal a retenção do documento de identificação pela autoridade prisional?

Discriminação

Os trabalhos de faxinagem dentro do EP do Linhó são rotativos. Conforme a semana, assim os presos a trabalhar vão para a porta da prisão, para o bar, para a lavandaria – que são os postos de trabalho mais prestigiados, digamos assim – ou capinar, tratar do gado, limpar as latrinas e a prisão, trabalhos menos prestigiados. Dá-se o caso de certos guardas com poder para tal resolvem entender que certos presos “não têm perfil” para um ou outro dos trabalhos mais prestigiados, interferindo na sequência das rotações escaladas entre tarefas que a todos implica. “Quem manda somos nós!” – dizem. Mas, se assim é, também terão que assumir a acusação de discriminação de que são alvo por tomarem decisões arbitrárias e sem fundamento. Terão também de evitar eventuais tendências xenófobas que com ou sem consciência disso possam estar implícitas nas suas escolhas. Até porque tais exemplos são bons para evitar nas prisões – mais do que noutros espaços onde a violência é menos latente.

Más contas


O recluso Hélder Costa, preso no EP do Linhó, recebeu 24 Euros pelo trabalho realizado ao longo do mês, dos quais um terço (6 Euros) ficaram no fundo de reserva e 18 Euros ficaram disponíveis, quando costuma receber à volta de 80 Euros. Convencido de ter havido algum engano, pediu que lhe revissem a situação. Recebeu, na volta, a informação de que os cálculos estariam correctos. A sua estupefacção foi grande, já que o trabalho que desenvolveu não teve nenhuma interrupção durante o mês. Face à situação em vigor, porém, nada pode fazer: é que a contabilidade do tempo de trabalho depende do guarda de serviço, cujos registos não estão acessíveis aos presos. É essa informação que passa para o economato, cujos registos não estão disponíveis aos presos. As máquinas de calcular fazem as contas mas essas não são verificáveis pelos interessados.

Quando este mês o informaram de que passaria a haver um prolongamento do prazo de entrega dos salários (se assim lhes podemos chamar) que foram até agora pagos até dia 12 e passarão a ser pagos dia 20 do mês seguinte à prestação do trabalho, embora tivessem afirmado ser essa nova situação decorrente de uma lei, o texto e as referências dessa lei não foram apresentadas aos interessados.
Estes dois casos revelam que a falta de transparência nestes processos deveria ser revista e a informação mínima deveria ser obrigatoriamente disponibilizada aos presos trabalhadores. Assim haja autoridade para tal.

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